Ramerrão (2011) de Ismar Tirelli Neto



Ramerrão (2011) é o segundo livro publicado por Ismar Tirelli Neto pela Editora 7Letras. A obra é composta por 40 poemas que durante 4 passagens sofrem a interferência de um anúncio que toma toda a página por letras em caixa alta: "QUAL / NÃO FOI/ NOSSA/ SURPRESA /QUANDO". Uma espécie de intervenção na página com referência concretista, mas também beira a ideia do balão recordatório dos quadrinhos,  balões que não se prestam a fala dos personagens, mas sim para representar o que não está visível nos quadrinhos, também ajuda a dar ação à história. Por exemplo: [ Enquanto isso, na sala de justiça ...]. As temáticas levantadas não se diferenciam muito de Os ilhados (2015), livro já comentado no blog. A questão do tempo gasto, o tempo que passa - inevitavelmente - para todos, o futuro que se mostra, para o eu-lírico, sem grandes perspectivas, a solidão do homem nos grandes centros urbanos, o medo, a cidade como ilha, a rotina e o tédio. As coisas materiais na poesia ganham vida enquanto  as pessoas e a vida social parecem, gradativamente, se desmanchar no ar. Há também o esforço da memória, o esforço em produzir boas memórias afetivas, como também o esforço de resguardá-las em um tempo fluido, sempre escapando das nossas mãos e da nossa mente. Esquecemos fácil das coisas, pois necessariamente elas não tiveram tempo de permanecer tempo necessário a criar laços de afeto. 



JUNHO 12

não há nada de exato nisso
(à laia de memória)
acorda abre
atrasado
para uma palestra
atrasado
para o Ano Novo
atrasado
para o próprio
apedrejamento
estou
a-oquei correndo
com uma ártica fatia
de pizza & um bule de café
no tanque & uma apreciação
todanova dos feriados
municipais
no Salão Dourado
muitos cavalheiros
e damas ocupam
de dizer sim e por
longo tempo não
lhes ponho em causa
os reais motivos
ponho-me
de emboscada
atrás dum auto-
(r)retrato, ele
ambula é mesmo
um moleque
exuberante
como de resto
ele também
& a tarde é fria
acende amarelo
para os táxis
o céu azul-hitler
acorda abre
play para
a ordem do dia

..

REGISTRO

Algo tramitou, fez um bissexto. O dia
tem um rodeio justo, para do outro lado, faz uma leitura
empanzinada. Haja, talvez, alguns búzios de arroz sobre
o prato, como se acabasse de dobrar esquina a van
Terror, o sangue cozido das feras, nem mesmo a extrema
parcialidade (sobrevivem) das flores que Anna comprou semana
passada, quando as contas folgaram. Escrevo. Qualquer estupidez
servirá de futuro. É enunciado, ausente, algo que acaba
(pelo contrário) te trazendo mais para junto, você pensa ouvir
as dragas, a rotação tercina das pás, as braçadas que esclarecem
a água, turvam a continuidade dos atos.
                                       Desengana. Não é esse o registro eleito
pelo coração quando está para se abater. Afinal, as hérnias não
lhe ensinaram nada? Você pensa nas pessoas que seguem quietas,
como lhes chega naturalmente, sem campanha ou quase. Lado a lado
com o silêncio delas, este aqui não passa de fantasmagoria. Urdo
para não ter problemas com os vizinhos.

..

REFERÊNCIAS

NETO, Ismar Tirelli. Ramerão. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2011.

Sites:

http://www.saposvoadores.com.br/2012/06/6-elementos-basicos-para-criar-uma-historia-em-quadrinhos.html





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