Os ilhados (2015) de Ismar Tirelli Neto



Composto por 52 poemas, Os ilhados (2015) de Ismar Tirelli Neto editado pelo selo da 7Letras, nos desafia a adentrar a aventura solitária e fragmentada do homem pós-moderno. Somos pequenas ilhas, o mundo como ilha? A cidade se materializando na linguagem como não-lugar, termo caro a Augé, nos revela um espaço sempre de passagem. Nossas memórias e afetos como rarefeitos gases a habitar um espaço em constante trânsito.   



AS CIDADES ANTEVISTAS
("O DIA HOJE ESTÁ QUE É UM CÓRREGO")

Se ele não volta,

(ele não volta)

bem depois, 

e por que não? É uma aventura grave -, concreto armado, obras 
de sapa -, além do mais, faz bem pouco tempo, falávamos
assentíssimos

sobre o tempo. Como tornou-se certeiro. Com o tempo. Como.
Sucessão de disparos. Como quê. Corretivos. O tempo

bom, sejamos francos, que diferença pode fazer agora um par de
anos?

Aqui pode-se fazer tudo a pé. Gosto das bibliotecas. Se ao menos
a prefeitura parasse de deitar cafés sofisticados por toda parte.
O problema

é que ninguém nunca nos perguntou o que julgávamos belo.
Ninguém nunca nos perguntou sequer o que julgávamos
necessário.

Que mais poderíamos fazer?

Não tínhamos escolha. Não éramos aristocratas.

... 

"TODAS AS HISTÓRIAS, MESMO AQUELAS QUE NÃO VÃO MUITO ALÉM DE SEUS PRÓPRIOS DESVIOS"

Longo tempo sem compreender a doçura com que me falavam 
as deblaques.

Incrustação de turistas na praça em outrem idioma-,impermeá-
veis bege, obstinados no outono, ninguém

chegaria a um acordo.

Todas as histórias, mesmo aquelas que não vão muito além de
seus próprios desvios, precisam ambientar-se em alguma parte. 

A questão que se põe - em que região do olho transcorre esta que
acabamos de contar? No branco, no azul?

Uma vez desligado o abajur,

que é feito do homem forte que nos olhava diretamente ao umbigo?
Da amiga que, sendo a última a deixar o escritório às quintas, pre-
cisa atravessar sozinha os mais longos corredores, cuida

que as sombras não

respinguem?

De uns trens
quando havia dois nadas
dois ou mais nadas
de uns trens que dividiam-no em dois
parentes remotos que viveram e morreram numa estação
                                                                 [ ferroviária azul

A questão que se põe - 

O que fazer o que fazer das memórias de infância daqueles que
não nos amam, dos que não alcançamos amar

Senão as mesmas palavras de onde nos lançamos
Todos os dias

                                                                                    repatriadas

...

Ismar Tirelli Neto é um poeta carioca, nascido em 1985. Atua também como roteirista, ficcionista e tradutor. Possui publicados os livros synchronoscopio (2008), Ramerrão (2011), Os ilhados (2015),  Alguns dias violentos (2014) pela coleção megamíni, todos publicados pela 7Letras, Duas ou três coisas airadas (2016), em parceria com Horácio Costa  pela Luna Parque e Os postais catastróficos (2018).


REFERÊNCIAS

TIRELLI NETO, Ismar. Os ilhados. 1ª.ed.- Rio de Janeiro: 7 Letras, 2015. 

SITES & ( + sobre Ismar )

https://oglobo.globo.com/cultura/livros/ismar-tirelli-neto-a-arte-da-irrealizacao-16726827
https://www.revistapessoa.com/autor/19/Ismar%20Tirelli%20Neto/
https://escamandro.wordpress.com/2017/11/10/5-poemas-ineditos-de-ismar-tirelli-neto-1985/
http://revistamododeusar.blogspot.com/2011/08/ismar-tirelli-neto.html

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